Obras de Karl Marx e Friedrich Engels, para ler e baixar.
Conversa com Escritores Mortos: Marx e Engels
A crise econômica mundial devolveu Marx aos debates. O Diário, atento, quis ouvi-lo na série Conversas com Escritores Mortos. Incluímos na conversa, por delicadeza, o melhor amigo de Marx, Engels, seu parceiro em muitos projetos, e também seu financiador dedicado, leal.
Herr Marx e Herr Engels, os senhores foram grandes intelectuais e revolucionários, além de terem sido os fundadores da doutrina comunista. Alguns dizem que foram até mesmo filósofos. Os senhores se consideram como tais?
Talvez um pouco, mas não muito. Somos muito mais revolucionários do que filósofos. Os filósofos apenas interpretaram o mundo, de várias maneiras diferentes; o ponto, no entanto, é que não basta interpretar o mundo – é necessário mudá-lo.
E essa, certamente, foi a intenção dos senhores.
Sim, é claro que sim. Os comunistas, como nós, lutam para atingir os interesses e objetivos imediatos da classe operária. Em uma palavra, em toda a parte os comunistas apoiam qualquer movimento revolucionário contra as ordens sociais e políticas estabelecidas. Tencionamos ascender o proletariado à classe dominante em nossa luta pela democracia.
Hmmm…
O que o operário assalariado obtém por sua atividade é o estritamente necessário para garantir-lhe a sobrevivência. Queremos apenas suprimir o caráter miserável dessa apropriação, em que o operário só vive para aumentar o capital e só vive enquanto o exigem os interesses da classe dominante.
E de que modo tencionam fazê-lo?
Os comunistas recusam-se a dissimular suas concepções e seus propósitos. Proclamam abertamente que seus objetivos só podem ser atingidos pela derrubada violenta de toda ordem social passada.
Com uma revolução, portanto?
Sim, e que as classes dominantes tremam à ideia de uma revolução comunista. Os proletários nada têm a perder, exceto seus grilhões. Têm um mundo a ganhar! É muito divertido pensar, no entanto, que o último capitalista que enforcarmos será aquele que nos vendeu a corda.
O que os motivou a escrever o Manifesto do Partido Comunista?
Um espectro ronda a Europa – o espectro do comunismo. Todas as potências da velha Europa aliaram-se para uma Santa Caçada a esse espectro: o papa e o czar, Metternich e Guizot, radicais franceses e políticos alemães. O comunismo, portanto, já é reconhecido como uma força por todas as forças da Europa e estava mais do que na hora de os comunistas exporem abertamente ao mundo inteiro suas concepções, seus objetivos e suas tendências e de contraporem à lenda do espectro do comunismo um manifesto do partido.
O partido foi criticado?
E como! Que partido de oposição não foi tachado de comunista pelos adversários no poder? Os comunistas também são recriminados por quererem suprimir a pátria, a nacionalidade. Os operários não têm pátria – não se lhes pode tirar o que não tem.
Compreendo. Vocês conseguiriam resumir em algumas palavras do que se trata a dita “burguesia”? E o “proletariado”?
Por burguesia entendemos a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social e empregadores do trabalho assalariado. Por proletariado entendemos a classe dos operários assalariados modernos que, não possuindo meios próprios de produção, reduzem-se a vender sua força de trabalho para que possam sobreviver.
Como a burguesia se originou?
Ela foi inicialmente um grupo oprimido sob o jugo dos senhores feudais. Posteriormente, na época do surgimento da indústria, tornou-se um contrapeso à nobreza na monarquia descentralizada ou absoluta, fundamento essencial das grandes monarquias. Com a criação da grande indústria e do mercado mundial, a burguesia conquistou finalmente a dominação política do moderno Estado parlamentar.
Poderíamos dizer, então, que a burguesia desempenhou na história um papel revolucionário decisivo?
Sim, visto que a burguesia destruiu todas as relações feudais, patriarcais, idílicas, estilhaçando os laços feudais que subordinavam o homem a seus superiores naturais, não deixando subsistir entre os homens outro laço se não o interesse nu e cru, senão o frio “dinheiro vivo”.
Como assim?
Submergiram nas águas glaciais do cálculo egoísta os frêmitos sagrados da piedade exaltada, do entusiasmo cavalheiresco, do sentimentalismo pequeno burguês, reduzindo a dignidade pessoal a valor de troca. Em resumo, a burguesia rasgou o véu de emoção e de sentimentalidade das relações familiares e reduziu-as a mera relação monetária.
Mas a dita piedade exaltada, o entusiasmo cavalheiresco e todas essas coisas não eram nada mais do que farsas, eram?
Exatamente, e é por isso que podemos afirmar que a burguesia substituiu a exploração disfarçada sob ilusões religiosas e políticas pela exploração aberta, cínica, direta e brutal.
Por falar em religião, Herr Marx, você nunca foi um grande entusiasta desta, não é mesmo?
A religião é o ópio do povo.
Como assim?
A religião é o suspiro das criaturas oprimidas, o coração de um mundo insensível e a alma das condições desalmadas. A abolição da religião como a felicidade ilusória das pessoas é a demanda para a verdadeira felicidade delas.
Entendo perfeitamente. Por vezes, penso nas monarquias e então na burguesia – e me pergunto se a última aboliu as classes hierárquicas existentes na primeira. Isso aconteceu, senhores?
Tentaremos explicar brevemente. Na Roma Antiga, temos patrícios, cavaleiros, plebeus e escravos; na Idade Média, senhores feudais, vassalos, mestres de corporação, oficiais e servos. A sociedade burguesa moderna, oriunda do esfacelamento da sociedade feudal, não supriu a oposição de classes. Limitou-se a substituir as antigas classes hierárquicas por novas classes, por novas condições de opressão, por novas formas de luta. E cada vez mais a sociedade inteira divide-se em dois grandes blocos inimigos, em duas grandes classes que se enfrentam diretamente: a burguesia e o proletariado.
Eu compreendo plenamente o fato dos senhores adotarem os interesses proletários. Ainda assim, gostaria de saber se vêem algum mérito nas ideias e realizações burguesas?
Sim. A burguesia foi quem primeiro mostrou quão capaz é a atividade humana. Realizou maravilhas superiores às pirâmides egípcias, aos aquedutos romanos e às catedrais góticas. Levou a cabo expedições maiores que as grandes invasões e as Cruzadas. Em apenas um século de sua dominação de classe, a burguesia criou forças de produção mais imponentes e mais colossais que todas as gerações precedentes reunidas.
E como isso foi feito?
Controlando cada vez mais a dispersão dos meios de produção da propriedade e da população. Aglomerando a população, centralizando os meios de produção e concentrando a propriedade em poucas mãos.
E os senhores consideram necessária a luta contra essa burguesia?
Naturalmente. As armas que a burguesia usou para abater o feudalismo voltam-se agora contra ela mesma. Mas a burguesia não forjou apenas as armas que lhe darão a morte; também engendrou os homens que empunharão essas armas, aqueles que chamamos de proletários, de quem já falamos.
Os senhores disseram que os proletários são aqueles que devem vender a força de trabalho para poderem sobreviver, uma vez que os meios de subsistência estão concentrados nas mãos dos capitalistas. É isso?
Sim, e deve-se ressaltar que os operários são uma mercadoria como qualquer outro artigo do comércio e, portanto, estão igualmente sujeitos a todas as vicissitudes da concorrência, a todas as flutuações do mercado.
Como assim, vicissitudes da concorrência?
A concorrência crescente dos burgueses entre si e as crises comerciais que daí resultam tornam o salário dos operários sempre mais instável. Fora isso, o aperfeiçoamento incessante e sempre mais rápido do maquinismo torna sua situação cada vez mais precária. Por conseguinte, à medida que o trabalho se torna mais degradante, o salário decresce.
E quais são as principais reivindicações do proletariado?
Que certos interesses particulares dos operários sejam reconhecidos pela burguesia sob forma de leis. Por exemplo, a lei da jornada de dez horas na Inglaterra.
Alguns aristocratas se posicionaram a favor da burguesia no momento em que viram que esta iria triunfar. Os senhores acham que burgueses passarão para o lado dos proletários caso considerem provável que eles vençam na luta entre as classes?
Sim. Isso acontece porque nos momentos em que a luta entre classes aproxima-se do auge, o processo de dissolução no interior da classe dirigente assume um caráter tão violento, tão áspero que uma pequena parte da classe dirigente desvincula-se desta e junta-se à classe revolucionária, à classe que tem o futuro nas mãos. Assim como outrora parte da nobreza passara para a burguesia, parte da burguesia passa agora para o proletariado, especialmente uma parte dos ideólogos burgueses que chegaram à compreensão teórica do conjunto do movimento histórico.
Então a luta do proletariado por seus direitos irá desesperar os burgueses, sim?
É claro que sim – o proletariado, a camada mais baixa de sociedade atual, não pode erguer-se, recuperar-se, sem estilhaçar toda a superestrutura de estratos que constituem a sociedade oficial e consequentemente desesperar os que pretendem que a sociedade continue do modo que está.
Herr Marx e Herr Engels, uma das frases mais célebres do Manifesto do Partido Comunista é a seguinte: “A existência da burguesia não é mais compatível com a sociedade”. Como assim?
Até os dias de hoje, todas as sociedades repousaram, como vimos, no antagonismo entre classes opressoras e oprimidas. Mas, para se oprimir uma classe, é necessário assegurar-lhes condições para que se torne possível, no mínimo, prolongar sua existência servil. O operário moderno, no entanto, em vez de elevar-se com o progresso da indústria, decai cada vez mais – abaixo das condições de sua própria classe. O operário transforma-se em indigentel, e a miséria cresce mais rápido do que a população e a riqueza. É por isso que dizemos que a sociedade não pode mais existir sob o domínio dos capitalistas, isto é, a existência da burguesia não é mais compatível com a sociedade.
Para finalizarmos, meus senhores, vocês podem diferenciar as aspirações da sociedade burguesa das aspirações da sociedade comunista?
Na sociedade burguesa, o trabalho vivo é apenas um meio para multiplicar o trabalho acumulado. Na sociedade comunista, o trabalho acumulado é apenas um meio para aumentar, enriquecer, fazer avançar a existência dos operários.
Texto extraído de: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-burguesia-e-o-comunismo-segundo-marx-e-engels/